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Santa Helena e Unilabor

18 nov

por Gisele Miranda

Geraldo de Barros (1923-1998) teve um elo importante com a fotografia, o  que o levou a vinculação com o Foto Cine Clube Bandeirantes desde sua criação, em 1952, momento em que esteve em contato com Thomaz Farkas (1924-2011) e German Lorca (1922- 2021).  

Geraldo de Barros, Fotoforma, c. 1949. Fotografia em papel de gelatina/prata (cópia a partir do negativo recortado, prensado entre duas placas de vidro) Foto Família Geraldo de Barros. https://www.geraldodebarros.com/main/

Na pintura, Geraldo esteve ligado a Clovis Graciano (1907-1988), Colette Pujol   (1913-1999), entre outros. Ele também criou a UNILABOR (Cooperativa de Móveis, 1954), em parceria com freis dominicanos para ser um local onde o artista tivesse uma  preocupação social.

Unilabor (detalhe) espaço de trabalho. Foto Família Geraldo de Barros. https://www.geraldodebarros.com/main/

Na Unilabor, Geraldo contou com a assistência do jovem pintor Gontran Netto (1933-2017), na época com 21 anos, autodidata, filho e neto de boias frias.

Uma fase importante da minha vida na UNILABOR (…) recebi a visita do frei dominicano João Baptista, recém chegado da França onde participou de experiências como padre operário. O frei me propôs participar de uma comunidade (ou cooperativa). Expôs o seguinte: -Temos informações sobre você (talvez passadas pelo professor Agostinho) e cremos que você seria a pessoa adequada para ajudar nesta tarefa. Sabemos de suas tendências comunistas e por isso teríamos alguém com tais atributos.’ (GGN, Relatos de uma Existência, 2010)

Na Cooperativa, Gontran teve o aval de Geraldo de Barros para ser assistente de Clóvis Graciano em um painel no Aeroporto de Congonhas, em 1954, para o IV Centenário da cidade de São Paulo. O painel Trabalhadores foi uma parceria de Clovis com Emiliano Di Cavalcanti (1897-1976). Essa pintura é parte do acervo artístico do aeroporto de Congonhas e encontra-se no espaço “pavilhão das autoridades”. Esse painel esteve no abandono e foi restaurado, mas continua sob acesso restrito às visitações por agendamentos de acordo com cada mudança política.

Clóvis Graciano e Di Cavalcanti. Os Trabalhadores. 3,5 x 16 m, 1954. Pavilhão de autoridades, Aeroporto de Congonhas. SP. In: Portal de periódicos UDESC. Florianópolis.

Há um outro painel de Clovis Graciano mais acessível, Operários, de 1960, na Avenida Rubem Berta que quase foi destruído por uma ação política, em  2017. Felizmente, a política do apagamento foi embargada.

O painel é a forma mais democrática da pintura. O governo, se quisesse, poderia mandar pintar painéis em logradouros públicos, como estações, campos de esporte, etc. É uma forma de levar a arte ao povo, de imortalizar momentos históricos, de maneira a que todos tenham possibilidades de vê-los. A tela pertence a uma minoria. O painel a todos quantos queiram vê-lo. (Clóvis Graciano, 15 jan. 1969. In: São Paulo Antiga)

Graciano fez parte do grupo Santa Helena (1935), ou seja, um grupo de artistas envolvido em diversas atividades para o próprio sustento. Após o horário de expediente eles se encontravam para pintar, debater técnicas e criticar o grupo da Semana de Arte de 22 em sua ‘aristocracia’ e seu ‘intelectualismo’.

No Santa Helena, os artistas eram proletários, imigrantes ou filhos de imigrantes. Todos tinham um trabalho de subsistência, de pintores de paredes e frisos, mecânicos, bancários, professores, figurinistas, cenógrafos, para manterem seus encontros na pintura. Eram eles, Alfredo Volpi (1896-1988), Francisco Rebolo (1902-1980) e Mario Zanini (1907-1971), Aldo Bonadei (1906-1974), Manoel Martins (1911-1979), Alfredo Rizzotti (1909-1972), Humberto Rosa (1908-1948), Fulvio Pennacchi (1905-1972) e Clovis Graciano. As temáticas e as técnicas eram diversificadas, mas a luta diária, os uniu.

Gontran Netto depois de seus 70 anos reiterou inúmeras vezes a dificuldade de “ser um caipira intelectual”, como se um não permitisse o outro. No grupo Santa Helena também houve um conflito semelhante: “ser um proletário intelectual.” Vingou o melhor dos temperos, mas o conflito foi inevitável e necessário.

Bonadei foi, segundo o crítico de arte Jacob Klintowitz, “o mais intelectual do grupo (…) formação erudita e um dos primeiros da arte abstrata no Brasil.” (Grupo Santa Helena. In: Enciclopédia Itaú Cultural).

Bonadei, Composição com Garrafa, 1955. Óleo sobre tela,
72,50 cm x 59,50 cm. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra2120/composicao-com-garrafa